"Não me roube a solidão sem antes me oferecer verdadeira companhia."


Friedrich Nietzsche



terça-feira, 19 de outubro de 2010

De volta...

Gosto da estrada, da emoção da partida, das paradas no acostamento, dos desenhos e defeitos no vidro que me impedem a vista completa das cidades e vilas que passam. Gosto da insegurança, da possibilidade e da alta probabilidade de algo acabar dando errado.
Gosto do barulho do motor, a pressão da frenagem e até mesmo do cinto de segurança. Gosto quando as luzes se apagam do lado de dentro, fazendo da janela um grande quadro, que se move e muda cada vez mais a cada quilometro, como um filme, seguindo uma sequência, um roteiro que talvez nós ja saibamos onde vai chegar, mas que quando visto novamente se parece parcialmente novo e tão surpreendente como da primeira vez. 
Se por acaso me sento na poltrona do corredor, me estico um pouco pra conseguir ver através da janela e me espremo o bastante para os outros passarem pela estreita trilha que corta o automóvel. O conselho é quase sempre o mesmo: "escolha sempre um lugar no lado do motorista". Conselho este que sempre pensei ser um absurdo, sendo que, se por um descuido da sorte um acidente acontecer, não seria muito lógico tentar controlá-lo, mesmo porque nunca se sabe de que lado ele acontecerá, se é que existe um lado especial pra acidentes acontecerem.
Gosto do ar condicionado, secando e irritando a garganta e as narinas. Gosto das duas lâmpadas na parte de baixo do bagageiro superior, muito úteis nas horas de leitura e das cortinas raramente usadas nas raras horas de sono. Gosto das casas na beira da estrada, de imaginar como deve ser viver ali, nas artérias da terra. E, é claro, tenho todo um carinho especial pelas pontes, das mais simples e perigosas até as mais bonitas e modernas. Gosto muito também dos túneis, do barulho abafado, da luz alaranjada e do alívio ao ver a luz do dia ou o breu da noite no final. Gosto da escuridão sendo interrompida, por segundos, pelas luzes de qualquer posto de combustível saturado de caminhões estacionados perto de restaurantes, lachonetes ou motéis próximos.
Gosto das curvas, das retas, das descidas e subidas. Gosto de viajar de tarde, de manhã, mas prefiro a noite. Gosto de viajar sozinho, com alguém ou com muitos. Gosto de reclinar o banco e olhar pra fora. Olhar pra fora de mim, do meu mundo, dos meus hábitos e rotinas. Gosto de ver quem há muito não vejo e conhecer pessoas das quais nunca imaginei a existência, ir a lugares novos ou até mesmo aos antigos dos quais senti saudade. Gosto de partir, mas gosto mesmo é de voltar. Pra casa. Gosto mesmo é do abraço de boas vindas e do beijo de saudade. Gosto de saber o que aconteceu enquanto eu estava fora e imaginar o que vai acontecer agora que voltei. Gosto do cheiro daqui e das cores que tudo tem aqui. Gosto do gosto disso tudo.

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