"Não me roube a solidão sem antes me oferecer verdadeira companhia."


Friedrich Nietzsche



sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Logo eu...

...Que sempre me achei tão esperto, tão inovador, versátil e a frente do meu tempo. Logo eu, que sempre me achei tão capaz e obstinado, que sempre achei saber o que precisava saber, transformando essa arrogância, essa prepotencia, em um lifestyle absoluto. Como se tivesse certeza do que eu queria ser, do que iria me tornar e do que a vida me reservaria.
Logo eu, que sempre pareci tão seguro de mim mesmo, tão confiante a respeito do suposto talento que eu tenho, tão faminto por novos horizontes e novas possibilidades. Logo eu que tratei e destratei, a tudo e a todos, do modo que melhor me convinha. Com tanta pose, tantos discursos bonitos, tantas opiniões. Logo eu que escrevia músicas tão boas pra mim mesmo, desenhei tão bem sem nunca ter estudado, argumentava tão bem sobre qual fosse o assunto na mesa.
Eu que sempre me achei esperto o suficiente para me destacar, sem precisar passar a perna em ninguém. Eu que sempre acreditei no dom que imaginava ter, acreditei na tendencia a ser o centro de conversas sobre pessoas sensatas e inteligentes. Eu mesmo, que acreditava, duvidei, acusei e apontei o dedo, voltei a acreditar. Eu que voltei atrás e me arrependi, entrei em contradição e menti tantas vezes pra sustentar o castelo de aparencias e continuar atuando nesse eterno teatro de marionetes, criando o roteiro que mais impressionasse, com as melhores caras e bocas que minhas qualidades cenicas permitiam.
Logo eu, tão admirado, ou nem tanto assim, mas pelo menos percebido. Logo eu...
...Me vi tão atrasado, contente com o avanço dos outros, mas tão decepcionado. Não me vi invejando o sucesso de ninguém ou mal dizendo suas conquistas e realizações, mas sim cobrando alguma atitude genuina, que realmente partisse de mim, que me trouxesse algo, material, espiritual, substancial e não mais artificial. Pois cansei das aparencias, de como ter que parecer ou agir. Cansei dessa cartilha, desse manual que eu mesmo ajudei a escrever e definir como plano de voo.
É engraçado, pensar em descer da pratileira de troféis, descer um degrau dessa escada feita de ego. É comico sentir-se bem sozinho, sem ninguém que consiga me atrasar e que eu consiga decepcionar. É bom respirar o mesmo ar, seguir o senso comum e escapar dos meus próprios moldes, feitos sob medida para o tamanho da minha fantasia e imaginação. É bom se sentir tão pouco e nem ser tão percebido, não ter o nome pronunciado e nem ser tão importante pra alguém. É bom poder descansar e pensar algo a respeito de mim mesmo, poder me criticar e me elogiar. Conseguir ficar mais comigo, do que maquiar a realidade ficando com alguém, como uma muleta, uma ponte que imaginamos ser sustentada por outra pessoa. É bom não ter o mundo seguro pelas mãos de Atlas, é bom não ter que lutar contra o sol pelo centro do universo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Aí está a coisa que todo mundo fala, meu querido. Aí está a vida, lhe provando a cada segundo que as suas escolhas não representam nada ao olhos do Universo. Sempre te cobrando, sempre te punindo, sempre te desafiando... e você? Apanha, e levanta. Apanha, e levanta de novo. Até que um dia você percebe que tem outras opções, que a vida lhe prepara um banquete recheado de pratos que você vai ter que aprender a gostar, ou passará fome.
Por que não provar?