"Não me roube a solidão sem antes me oferecer verdadeira companhia."


Friedrich Nietzsche



terça-feira, 30 de novembro de 2010

Por que é proibído pisar na grama?

"Acordei com uma vontade de saber como eu ía e como ía meu mundo..."
Jorge Ben

Havia sonhado na noite passada. De fato, não lembrava os detalhes, recordava-se apenas de acordar sentindo a falta de algo.

Era uma garota, ainda lembrava-se de pedaços, de alguns sorrisos. Teve a absoluta certeza de que nunca tinha a conhecido antes, quando acordou, nem mesmo em sonhos. Talvez tenha a visto em algum vagão do metro, em algum bar conversando com as amigas ou em algum café lendo um livro velho qualquer. Não fazia tanta diferença. O que tinha certeza, é que gostava bastante dela, ao menos na confusão ludibriante daquele sonho. Tinha a certeza de que ela era o centro das suas atenções e que não precisava de um nome, estavam juntos, isso bastava.

Tinha as mãos finas e macias, lembrou-se de que segurou-as quase forte demais para senti-las. Dobrou-lhe os dedos e os pressionou com a palma de sua mão, desejando o estalar das articulações de suas falanges. Ela pressentiu a intenção e pediu lhe sorrindo para que não o fizesse. Tarde demais.

Foi fácil, mais do que imaginava. Os dedos não apresentaram nenhuma resistência à pressão, dobraram-se de leve e estalaram-se, um após o outro, em um movimento delicado, provocando um riso nervoso e íntimo nos dois. Ela era sua. Você tinha certeza disso.

Em um instante não havia mais vozes, apenas das outras pessoas, amigos coadjuvantes actuando no seu sonho. Ela era a única estranha, mas a única que importava-lhe. Lembrou-se depois de ter sentido seu cheiro, isso obrigou-lhe a render-se a lembrança que venceu suas pálpebras fechando-as de repente. Era o perfume que os anjos deviam ter. No mesmo instante, chegou a sentir o atrito dos lábios dela nos seus, das línguas libertando-se do céu da boca. Não se importaria em nunca mais acordar. Aquela estranha era a pessoa que mais parecia confiar em ti.

Acontece que os sonhos lhe proporcionam doses artificiais do que não consegue em sua vida de olhos abertos, pelo menos não o bastante. Então, levantou-se da cama com um vazio. Com a saudade do que você sabe que nunca teve, uma paixão involuntária por aquela garota que você não conhece, pelo tempo em que dividiram uma ilusão. Andou por algumas calçadas, cantarolando uma canção de Jorge Ben, gravada em 1976. De algum modo a música lhe permitia fatias de memórias. Ponderou por um tempo sobre o absurdo de ter se apaixonado por uma mulher de mentira, que visitou sua cama indiretamente, que lhe fez sentir - quimera - esta falsa felicidade com um toque, um encontro de bocas. Pensou em voltar a dormir, mas sabia que ela tinha ido e que talvez voltasse pra uma outra noite, talvez, qualquer dia desses.
Arrivederci!

"Preciso às vezes ser durão, pois eu sou muito sentimental, meu amor... Preciso de carinho, pois eu quero ser compreendido, preciso saber que dia e hora ela passa por aqui e se ela ainda gosta de mim..."
Jorge Ben

3 comentários:

Juliana disse...

E quem disse que o que você chama de vida não pode ser um sonho? E quando você acha que está dormindo, na verdade está acordado?

Giovana disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Giovana disse...

Eu sempre soube que atrás de um homem durão havia esse sentimento bonito, pena que eu não conheci naquela época :)
Eu admiro muito esse seu talento de escrivão!
Boa sorte na sua caminhada pela vida Rosseto, espero que vc conheça essa mulher dos seus sonhos!

Beijos